sexta-feira, 11 de abril de 2008

O cofre

Há algum tempo estava passando de carro por uma avenida e me deparei com um vendedor de cofres, aquilo ficou em minha cabeça durante dias. Fiquei pensando nos argumentos que um vendedor de cofres usaria pra me convencer de que aquilo realmente seria útil pra minha vida. Resolvi escrever, uma pequena cena. Vamos a ela!


(palco sem nenhum objeto cênico, muito iluminado, excessivamente iluminado)

(Ela solta um urro bem forte e então começa a falar como se aquele urro não tivesse existido) Olá!!! Oi!!!! Alguém pode apagar essa luz pra eu poder enxergar? (Para o público) Não sei. Não faço idéia onde, o que, e muito menos quanto tempo faz que estou aqui. Será que... o cofre!!!

– Me lembro de estar em casa num domingo pensando “Preciso descobrir o prazer de descascar” Sim, porque naquela manhã eu estava comendo lechia e sentia muito prazer na hora de degustar, mas descascar era meio chato. Tive a idéia de descascar todas e depois ter muitos prazeres consecutivos. Não o fiz. Pensei, é natural assim. Menos prazer, mais prazer, menos prazer, mais prazer... e era domingo também, pra que pensar nisso? Então a campainha tocou, fui atender. Era um vendedor, de cofres, é, achei aquilo bem esquisito, e por curiosidade resolvi convidá-lo a entrar. Ele começou a falar longamente sobre a importância de um cofre na vida das pessoas, e era tão passional o seu discurso que quase me comoveu, agradeci e disse que não estava interessada (o que era mentira), ele deixou seu cartão e foi embora. Aquilo virou uma obsessão gradativa, comecei pensando em que um cofre me poderia ser útil, o que eu guardaria nele, tentei conversar com o Luis sobre isso mas ele estava ocupado demais com seus projetos medíocres e inúteis, aos poucos fui perdendo o sono, ou quando dormia sonhava com ele, fui adquirindo uma necessidade de possuir um cofre, o cofre, uma necessidade vital, peguei o cartão do vendedor e liguei.

– Meu cofre!!!!! Eu agora tinha o cofre!!! Estava me sentindo tão feliz, um pouco vazia, mas feliz, acho. Três dias fiquei contemplando a beleza daquele cofre. Era bom abraçá-lo e sentir o geladinho dele, ele era sempre gelado, sempre duro, sempre pesado e sempre preto. Ah!! E ele nunca saia do lugar, era tão firme!!!! No quarto dia tomei coragem de abri-lo (talvez eu não devesse tê-lo feito), peguei o segredo, girei, girei, girei e... quando abri a porta do cofre tudo escureceu, não sei quanto tempo fiquei naquele escuro, pelo menos o suficiente pra que eu começasse a criar intimidade com o breu, estava até gostando, quando essa maldita luz apareceu, não vejo meu sofá, meu tapete, e... as minhas janelas! Quem roubou as minhas janelas? Não vejo nada!!!! Levaram tudo, tudo, portas, janelas, a casa... Onde é que estou??? Não, não, isso não... (ri) Tudo bem, agora podem parar, se é algum tipo de brincadeira, acho que a graça já acabou. (riso nervoso)

(Ela solta um urro bem forte e então começa a falar como se aquele urro não tivesse existido) Olá!!! Oi!!!! Alguém pode apagar essa luz pra eu poder enxergar? (Para o público) Não sei. Não faço idéia onde, o que, e muito menos quanto tempo faz que estou aqui. Será que... o cofre!!!

Um comentário:

René Piazentin disse...

Obrigado por ter me estimulado a ir no Ícaro. E por apresentar o Barão. E por incentivar a enfrentar o Água Viva.
Beijo!